quarta-feira, novembro 30, 2005

Barbárie e Civilização
(História Universal, Lisboa, D. Quixote, 1979)

Celta moribundo, c. 230-220 a.C., Museu Capitolino, Roma

INDO-EUROPEUS
“Este termo, tal como o de semitas, designa um conjunto de povos que falam línguas aparentadas e não tem nenhum valor étnico ou cultural. Nasceu no nosso século XIX, a partir do parentesco das línguas célticas, itálicas, germânicas, bálticas, eslavas, helénica, arménia, indo-iranianas (…). Começou, então, a procurar-se o centro e a data de dispersão das populações que em seguida levaram as estruturas linguísticas comuns a um espaço imenso que, no 1º milénio a.C., se estende da Irlanda a Bengala. A solução parece impor-se, uma vez que os fins do 3º milénio assistem simultaneamente a migrações bélicas na Europa e à chegada ao Próximo Oriente dos povos conhecidos como falando línguas indo-europeias.
Numerosos arqueólogos fazem partir estas migrações da grande estepe euroasiática e mais particularmente da estepe pôntica (ao norte do mar Negro)”.
Vol. 1, p. 163.

POVOS “FORA DO TEMPO”
“No seu conjunto, em meados do século VI a. C. a maior parte das terras habitadas possui uma cultura bastante próxima do Neolítico, quando não fica esquecida no coração das florestas tropicais ou nas imensas extensões de continentes desconhecidos, com formas de vida rudimentares, caça e colheitas, herdadas do Paleolítico (…). Ao fim e ao cabo, não há grande diferença entre estas populações “atrasadas” (…) e as camadas rústicas das regiões ditas “civilizadas”. Com frequência, costumes e condições de vida parecem muito semelhantes e, pelo que sabemos, os estados mentais, os ritos, as crenças são análogos. Mas, em país “civilizado”, o aparecimento de poderes organizados e a urbanização foram, desde há muito, os factores decisivos duma evolução acelerada (…).
Depois da imensa actividade e das perturbações que se prolongaram até ao séc. VII, o ano 550 a. C. surge como o apogeu de um período de agitação e consolidação. Formam-se quatro grupos principais, os quais, sem se fixarem definitivamente, já não mudaram de sítio em relação aos outros. O Ocidente é dos Celtas, desde Portugal à Boémia. A Europa central reúne (…) os que serão conhecidos sob o nome de Germânicos, Bálticos, Dácios, Vénetos e Ilírios. Mais a leste, a região “pôntica” (desde os cárpatos até leste do mar Cáspio) é o domínio dos Citas, o que mais esteve em contacto com as civilizações mediterrâneas, de qualquer modo, o mais rico e o mais brilhante. Finalmente, do Norte do Tibete até aos Ordos, agitam-se os Turco-Mongóis, fazendo pressão sobre a China dos reis Tchéu em decadência”.
Vol. 2, pp. 14-16.

“BARBÁRIE” E “CIVILIZAÇÃO”: SOCIEDADE, POLÍTICA, ARTE
"Antes da penetração das influências helénicas, que contribuirão para difundir na Europa continental, essas civilizações originais favoreceram o desenvolvimento de uma certa comunidade cultural do mundo bárbaro. Seria necessário descrevê-la (…) antes das grandes conquistas da romanização (…).
Em primeiro lugar, na ordem social e política, os Bárbaros mostram-se tão indiferentes aos valores da Cidade, incarnados pelo mundo antigo nas instituições da Mesopotâmia, Fenícia ou Grécia, que são refractários à noção de Estado, presentes sob diversas formas no Egipto faraónico, na Babilónia do tempo de Hamurabi e, logo a seguir, em Roma. Em compensação, são muitos sensíveis ao sentimento de uma tradição, de uma comunidade, de uma pertença livre e ampla àquilo que se irá concretizar nas Nações (…). Por conseguinte, não é de admirar que os Bárbaros continuem mais apegados a sistemas de subordinação, fundados num laço de “clientela”, enquanto tendências “esclavagistas” assinalam o desenvolvimento do mundo oriental e greco-romano.
No domínio artístico, os bárbaros têm menos que os gregos a visão antropomórfica das coisas. Não sentem na harmonia do corpo humano e na arquitectura interna das suas formas a espécie de expressão profunda da ordem do cosmos que nele procuravam os artistas e pensadores da Hélade, talvez em consequência das especulações matemáticas e teológicas dos egípcios. Como os Sibérios e os Iranianos, preferem a figuração animal para traduzirem o mistério do mundo e se aproximarem do sobrenatural e do divino. Não hesitam em deslocá-la, em contorná-la, para inseri-la nos esquemas subtis da sua decoração linear. Quando nela integram igualmente a representação humana, é com predilecção pelo símbolo da cabeça, isolada ou desproporcionadamente grande, reduzida por achatamento quase a duas dimensões, tratada como que com desígnios geométricos.”
Vol. 2, pp. 207-209

Como orientação bibiográfica, consulte-se, também, Y. de Bonnefoy (dir.), Dictionnaire des Mythologies (...), s.l., Flammarion, s.d., existente na biblioteca (CD) do Ar.Co.

Livro de Kells, c. 800 d.C., Trinity College, Irlanda

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