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Ha ahi grande deferença entre o antigo, que é muitos annos antes que nosso Senhor Jesu-Cristo encarnasse, na monarchia de Gretia e também na dos romãos e entre o antigo a que eu chamo velho, que são as cousas que se fazião no tempo velho dos reyes de Castella, e de Portugal, jazendo a boa pintura inda na cova. Porque aquelle primeiro antiguo é o eicellente e elegante, e este velho é o pessimo e sem arte. E o que hoje se pinta, onde se sabe pintar, que é sómente em Italia, podemos lhe chamar tambem antigo, sendo feito hoje em este dia.
Como noutras ocasiões, Holanda (1517-1585) antecipa a formulação de temas maneiristas pela própria teoria italiana. Vasari (1511-1574) di-lo-á assim, em data posterior:
Ma perché più agevolmente si intenda quello che io chiami vecchio et antico, antiche furono le cose, inanzi Costantino, di Corinto, d’Atene e di Roma e d’altre famosissime città, fatte fino a sotto Nerone, ai Vespasiani, Traiano, Adriano et Antonino, perciò che l’altre si chiamano vecchie che da San Salvestro in qua furono poste in opera da un certo residuo de Greci, i quali più tosto tignere che dipignere sapevano.
Giorgio Vasari, Le Vite de' più Eccellenti Pittori, Scultori e Architettori, "Proemio". As Vite tiveram uma primeira edição florentina em 1550, tendo sido novamente publicadas em 1568, com alterações e os retratos dos artistas biografados. Podem consultar-se várias publicações "online": a frase citada encontra-se-á, por exemplo, na página 50 de uma versão em pdf.
Mas o mais interessante é, para nós, a forma como este texto de Holanda, que inicia o capítulo XI da sua obra teórica de maior fôlego, estabelece a relação do Renascimento(-Maneirismo) com a Antiguidade: em primeiro lugar, o Antigo é só um, onde Grécia e Roma surgem indistintas. Em segundo lugar, o presente de Holanda, que estabelece um embrião de progresso em relação ao passado próximo ("medieval", diríamos nós), aceita a Antiguidade como um modelo virtual que actualiza, podendo, então, esse presente quinhentista ser tão antigo como o passado de Péricles ou o de Adriano. O modelo antigo só não se copia por isso mesmo: o original é uma matriz fora do tempo que se materializa em tempos diversos, nenhuma dessas materializações sendo mais original ou mais cópia do que as outras. O Antigo é, no Renascimento, o mesmo Antigo que os bárbaros tinham mandado para a cova, a mesma entidade, renascida: uma Bela Adormecida que voltou a acordar. Não outro, mas o mesmo.
Uma das mais espectaculares obras de Francisco de Holanda, De Aetatibus Mundi Imagines, 1543-1573, encontra-se integralmente "online", no site de obras digitais da Biblioteca Nacional de España, que a possui no seu espólio.
Uma das mais espectaculares obras de Francisco de Holanda, De Aetatibus Mundi Imagines, 1543-1573, encontra-se integralmente "online", no site de obras digitais da Biblioteca Nacional de España, que a possui no seu espólio.
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